Intimação do advogado no balcão fere isonomia

O Artigo 236 do Código de Processo Civil brasileiro (Art. 236 do CPC) poderá ser acrescido de mais um parágrafo, no caso, o § 3º.
O Projeto de Lei nº 6.898/2006 (PL 6898/06), conforme a justificativa apresentada, pretende "agilizar a intimação do advogado quando ele retira os autos em carga do cartório ou da secretaria do foro na pendência de publicação de uma decisão proferida nesses autos." (acompanhe o andamento da proposõção clicando aqui)
Entendemos que, por isso, o projeto contém proposta inconstitucional, por violar o princípio da isonomia (Art. 5º da Constituição Federal).
Os prazos, assim, poderiam ter início de contagem diverso para as partes do processo.
Há algum tempo atrás, enviei e-mail aos Deputados Federais, alertando sobre este meu entendimento.

Aprovado o texto, tal como está, haverá desequilíbrio no tratamento que deve ser isonômico entre as partes. Isto ocorrerá porque é comum que nos processos judiciais as partes envolvidas estejam representadas por advogados que tenham diferentes meios de acompanhar o andamento processual. Aquele que comparece pessoalmente e retira os autos será logo intimado dos atos até então ali praticados e terá que se manifestar para evitar a preclusão.
Do outro lado, se a parte contrária estiver representada por advogado que não compareça pessoalmente em cartório, mas acompanhe o processo através de terceiros (estagiários sem poderes para receber intimações - § 2º do Art. 3º do EAOAB) ou através da informação disponibilizada pelos tribunais na internet (alguns advogados ainda não usam ou não podem usá-la), sobre a decisão de que seu ex-adverso já foi intimado porque retirou pessoalmente os autos, poderá se beneficiar deste tratamento que peca pela falta de isonomia.

A contagem dos prazos processuais não terá o mesmo termo para ambas as partes. O advogado que pessoalmente comparece ao cartório judicial, retirando os autos, no dia seguinte verá iniciado o prazo para a prática do ato, enquanto para aquele que não comparece, ou porque tem alguém para fazê-lo em seu lugar ou mesmo não vai em cartório porque pode acompanhá-lo pela internet, o prazo só terá a contagem iniciada com a publicação da decisão de intimação pela imprensa oficial, ainda necessária.
Por exemplo, uma decisão que determina às partes a manifestação sobre o laudo do perito oficial: aquela que tem o patrono que não comparece pessoalmente em cartório terá nítida vantagem sobre aquela que o advogado comparece pessoalmente. Este será intimado em balcão e no dia seguinte terá o prazo iniciado, sendo que o primeiro, mesmo que já saiba do conteúdo da perícia porque tem estagiário para providenciar-lhe as cópias, poderá preparar sua manifestação com mais tempo, podendo até conhecer o que disse a parte contrária, porque, lembremo-nos, aquela primeira já teve o prazo inciado antes, com o comparecimento de seu patrono em cartório.

Note-se também que a alteração em muito pouco, ou em quase nada, fará agilizar a tramitação processual, tal como justifica o nobre Deputado Sandes Júnior, uma vez que, em sendo comum o prazo - e boa parte deles o é, ou como no exemplo do parágrafo anterior, o cartório judicial só poderá dar andamento ao feito após transcorrido o prazo legal ou judicial contado da publicação através da imprensa oficial, obrigatoriamente.

A isonomia no tratamento entre as partes de um processo judicial deve ser preservada (caput do Art. 5º da Constituição Federal). A parte que esteja representada por advogado que não comparece pessoalmente ao Fórum, mas verifica o andamento das suas causas através de estagiários ou funcionários sem poderes para receber intimações, em geral aquela com maior poder econômico, ao cabo, terá mais tempo para preparar suas peças processuais e, eventualmente, antes de protocolizar a sua peça, até mesmo conhecerá o que a parte contrária disse. A outra parte, patrocinada por advogado que comparece pessoalmente ao cartório, terá o prazo iniciado no dia seguinte, enquanto a primeira, só após a publicação pela Imprensa Oficial.
Podemos lembrar também que com a democratização da tecnologia, muitos não mais retiram os autos do processo em carga de cartório, pois é prático tirar fotos (por celulares, câmeras digitais, etc.) ou 'escanear' os documentos de interesse, no próprio balcão. O prazo, também assim, não correria sem a imprescindível publicação.
Os advogados chamados 'umbigos no balcão' serão os mais prejudicados e, certamente, são aqueles menos responsáveis pela falta de celeridade processual. Aqueles que têm interesse na rápida solução do litígio, comparecem insistentemente em cartório.
A medida, se aprovada, poderia até surtir efeito absolutamente contrário ao pretendido na justificativa, uma vez que, conhecida a presunção de intimação pela retirada dos autos de cartório, afastar-se-iam dos cartórios aqueles que a quisessem evitar.
Convidaremos os Deputados Sandes Júnior, autor do projeto, e Bonifácio de Andrada, relator designado, bem como as respectivas assessorias, por e-mail, para deixarem aqui a sua opinião.